Planos complexos, humor cáustico, muitas balas e… Mel Gibson!








Mel Gibson é uma figura estranha em Hollywood. Além de uma carreira de altos e baixos atuando em produções de vários estilos, em especial filmes de ação memoráveis, já se aventurou como diretor, produtor e roteirista várias vezes, resultando em produções premiadas, mas controversas, como “A Paixão de Cristo” (2004) e “Apocalypto” (2006). Com o perdão do termo, o ator/diretor/produtor/roteirista é, no mínimo, “fora da casinha”.
“Em Plano de Fuga” (“Get the Gringo”), Gibson fez parte da produção como roteirista, produtor e ator principal. Apesar de passar longe dos caminhos épicos de seus outros roteiros, é difícil negar o volume de personalidade e esmero injetado no longa:
Um criminoso norte-americano (Mel Gibson), durante uma fuga após um roubo milionário, acaba ultrapassando a fronteira para o México. Capturado por policiais corrputos, o “Gringo” vai parar em uma imensa prisão mexicana – um lugar perigoso e estranho, que funciona com suas próprias regras e onde formou-se um tipo de cidade, tudo controlado pelo criminoso Javi (Daniel Giménez Cacho) e seus capangas. Tentando encontrar uma maneira de escapar, o Gringo conhece um garoto de dez anos (Kevin Hernandez) que vive com sua mãe (Dolores Heredia), os dois tem seus próprios problemas com Javi, e passam a ajudar o Gringo. Enquanto isso, o dinheiro roubado, em posse dos policiais, começa uma série de problemas que começam os bastidores da prisão.

Se destacando por personagens fortes e memoráveis, “Plano de Fuga” traz um elenco que conquista o público sem esforço. Aliás, reparou que, dos quatro personagens principais, só foi mencionado o nome de um deles? Pois é – a ótima construção dispensa os nomes, nos deixando, de alguma maneira, ainda mais próximos deles. (A questão de como chamar o Gringo, aliás, é uma piada recorrente na trama)
Gibson claramente escreveu o papel já pensando em si mesmo, o que torna tudo muito melhor. O protagonista é sarcástico, violento, perigoso, desonesto mas, ao mesmo tempo, tem um grande coração. Em um antro de criminosos, ele é um dos mais brilhantes, sabendo como ninguém aproveitar suas habilidades de observação e malandragem, mas também é o primeiro a fazer o bem – à sua maneira – com elas. Um ótimo anti-herói que melhora a cada cena de perseguição, tiroteio, pancadaria ou explosões.

Javi e a mãe do garoto, apesar de boas atuações, não fogem do padrão tanto em originalidade quanto qualidade, mas o garoto encarnado por Kevin Hernandez garante boas doses da personalidade do filme, além de ser um dos pontos-chave do roteiro.
O enredo, aliás, aproveita de uma ótima narração pelo próprio Gibson, adicionando um ritmo divertido, que nos coloca na mente do protagonista malandro. A montagem é um dos pontos fortes, permitindo quebras e alternando cenas de modo a gerar um desenvolvimento fluído e resultados inesperados. Por vezes, vemos cenas que não sabemos como se encaixam na totalidade do filme, só para nos surpreendermos em seguida com os resultados. Some a isso o senso de humor cáustico do protagonista e cada desenvolvimento se torna muito mais interessante.

Contando com dezenas de extras em cada cena, a ambientação é de longe um dos maiores esforços do filme. Não só temos toda a população da prisão extremamente bem caracterizada, os cenários em si contam muito da história do local – aliás, boa parte da produção foi de fato feita na prisão Ignacio Allende. A maneira suja, violenta e agressiva do ambiente existe nos personagens e permeia a trama como um todo. “Plano de Fuga” não se passa num lugar bonito e faz questão de nos lembrar disso.
Memorável pelo seu estilo diferente, recheado de elementos interessantes, é uma ótima opção para quem quer um filme de ação que fuja dos moldes de heróis certinhos, bonitões e sem graça.
A propósito, se você não adivinhou até aqui, este é um filme relativamente violento e com alguns momentos com sangue considerável. Apesar de não ser gratuito ou excessivo demais, temos ferimentos claros à bala e alguns outros menos tradicionais. Nada de mais para quem já está acostumado, mas fica o aviso para aqueles que sofrem com esse tipo de coisa.